A família da pessoa com deficiência e a relação com as redes de apoio


Jorge Lucas

A notícia de que terão um filho portador de deficiência alterará todo o curso da vida dos pais - antes mesmo do nascimento, diversas questões irão tomar conta de sua atenção, como o nível de comprometimento do filho e os cuidados que serão necessários para seu desenvolvimento saudável. Tais cuidados certamente demandarão investimentos financeiros e um enorme gasto de energia para a procura de uma equipe pedagógica adequada, escola, materiais assistivos, entre outros.

O nascimento de uma criança com necessidades especiais irá fazer com que sejam necessários cuidados físicos, programas de estimulação e lazer, revisões médicas constantes e, principalmente, uma harmonia entre todas as equipes de apoio. Esse enorme bombardeio de informações e responsabilidades irá, certamente, desencadear diversas reações emocionais nos pais, que desenvolverão todo um processo de luto para que, finalmente possam atuar de maneira consciente tendo em vista a qualidade de vida da criança.

Inicialmente, haverá o choque por conta da notícia, depois, é provável que entrem e um estágio de negação e passem a ignorar o problema, posteriormente, haverá reações emocionais que podem ir desde a irritação até a culpa ou depressão, para que finalmente haja a aceitação do quadro, resultando na adaptação através da qual poderão agir.

Obviamente, esse processo de “luto” se configurará de diferentes formas de acordo com a situação e a subjetividade de cada pessoa, porém, o que é mais marcante e certo é o fato de que envolverá, de certa forma, sofrimento psíquico e dificuldades das mais diversas formas, de maneira que se faz necessário levar em conta não só as necessidades da criança, mas de toda a família em questão.

Estabelecer um vínculo saudável com os profissionais de apoio e a escola torna-se essencial - existem muitos modelos propostos de relação entre a família e os profissionais de apoio:

  • Um modelo expert, por exemplo, é aquele onde o profissional adquire a postura de “detentor do saber”, e a família, então, será uma mera fonte de dados a respeito do quadro. Tal padrão muitas vezes resulta em uma sobrecarga do profissional e o desamparo da família, sendo essa uma realidade a se evitar em determinados casos.

  • No modelo transplante, o conhecimento do profissional é compartilhado com os pais, de forma que esses passam a assumir também suas responsabilidades, podendo resultar assim em uma forte sobrecarga dos pais em relação ao quadro.

  • No modelo usuário, a família se coloca como uma entidade a exigir seus direitos em relação ao quadro do filho, como assistência médica e terapêutica – nesse caso, espera-se dos pais uma enorme detenção de conhecimento por parte do filho e sua situação.

  • Por fim, o modelo negociação é aquele onde pais e equipe irão debater, em igualdade, as práticas que serão utilizadas no processo terapêutico do filho, havendo assim um envolvimento igualitário de ambas as partes.

Cada um desses modelos possui pontos fortes e fracos, de maneira que o contexto pode acabar determinando a maneira com que pais e equipe irão se relacionar. Por exemplo, em casos onde a família encontra-se em uma situação de extremo desamparo e insegurança, pode ser necessário que haja um modelo de relação do tipo expert.

A relação família-escola também é um fator que merece atenção, pois, muitas vezes, pode haver insegurança por parte dos pais a respeito de confiar a responsabilidade de seus filhos a desconhecidos. Dessa forma, é essencial que se faça uma procura de boas instituições, preferencialmente ouvindo a recomendações de amigos ou conhecidos, ainda mais se estes tiverem também entes da família que forem portadores de deficiência. O segundo passo, mas não menos essencial, é que haja um estabelecimento de confiança para com a escola, estabelecendo-se, assim, uma situação de boa relação entre a mesma e a família. Por fim, o esforço coordenado de equipe multidisciplinar, escola e família certamente irá trazer resultados bastantes satisfatórios no contexto do desenvolvimento do indivíduo com deficiência.

A boa relação entre profissionais e a família é essencial, porém, é necessário que haja cuidado por parte de ambos a respeito da afetividade. Em casos extremos, o envolvimento exagerado do profissional poderá acarretar um uma completa perda do papel profissional em detrimento de um papel de amigo. No outro extremo, o afastamento afetivo trará frieza à relação, resultando em uma falta de envolvimento e, muitas vezes, desconfiança de ambas as partes. O envolvimento emocional é importante, ainda mais no contexto da prática psicológica, porém, é necessário cuidado para que não haja confusão entre os papéis de profissional e amigo.

REFERÊNCIAS

COLL, et al. Transtornos do desenvolvimento e necessidades educativas especiais: Volume 3. 2ª edição. São Paulo: Artmed, 2007.